08/12/2005 - 21h36
Médico explica os riscos do paracetamol e diz que
não sabe por que remédio continua no mercado
Veja a entrevista em vídeo
Da Redação
Pesquisa divulgada pela revista científica New Scientist alerta sobre os
riscos que o paracetamol traz para a saúde depois que foi divulgado que o
analgésico se tornou a principal causa de insuficiência hepática nos Estados
Unidos. O estudo mostra que a proporção de problemas no fígado causados
pelo medicamento chegou a 51% do total em 2003. Em 1998, esta
proporção era de 28%.
Os cientistas americanos responsáveis pelo estudo chegaram à conclusão
de que 20 comprimidos de paracetamol por dia são suficientes para causar
insuficiência hepática e levar à morte - a dose máxima recomendada é de
oito.
Em entrevista ao UOL News, o toxicologista Anthony Wong, do Centro de
Assistência Toxicológica do Hospital das Clínicas, deu uma aula sobre o que
se deve e o que não se deve fazer no uso do paracetamol, admitiu não saber
por que o remédio ainda continua no mercado e explicou que a dosagem
perigosa varia de pessoa para pessoa.
"A quantidade de comprimidos é altamente variável. Só aqui no Brasil tem
comprimido de 750mg. Na Inglaterra só tem de 500mg e de 360mg. Nos
Estados Unidos existem comprimidos de até 1g, mas isso ainda é muito
restrito. Nos Estados Unidos, inclusive, já há restrições, com advertência de
caixa preta, para que as pessoas não tomem paracetamol com bebida
alcoólica. Se tomar mais de 3 doses de bebida alcoólica não pode tomar
paracetamol."
Ainda sobre a dosagem, lembrou: "20 comprimidos é uma dose média, mas
há pessoas que já tiveram falência hepática tomando 8 comprimidos de
500mg, que dá 4g. É importante salientar que a máxima diária são 4g de
paracetamol, desde que não tenha álcool, problema hepático ou o paciente
não esteja tomando um outro remédio."
Nada de paracetamol na ressaca
Ele contou que a velha prática de tomar um comprimido com paracetamol
em dias de ressaca para combater a dor de cabeça deve ser completamente
abolida da vida das pessoas. "É uma boa advertência para essa época de
natal e ano novo. Não se pode tomar um porre e depois tomar paracetamol,
pois pode causar lesão hepática fulminante mesmo em doses menores do
que 20 comprimidos. Também não pode tomar aspirina, porque ela aumenta
o sangramento gástrico."
Para Anthony Wong, a pesquisa vem numa boa hora. "É importante e muito
bem-vindo o alerta, porque os americanos e principalmente os brasileiros
tomam remédios como se fossem 'M&Ms'. Não pode." Ele contou que nos
Estados Unidos, além da morte causada por falência hepática, o
paracetamol é a principal causa de morte por intoxicação de todos os
remédios que existem no país."
"Então por quer ainda está no mercado?", perguntou a jornalista. "Nos
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Estados Unidos tem um forte trabalho de marketing em cima do FDA. Já na
Europa há muitas restrições. Na Inglaterra, por exemplo, só se pode comprar
uma caixa por mês."
Segundo o médico, febre muito alta, jejum prolongado ou vômito prolongado
em crianças ou adultos são muito perigosos. "Isso esfolia a pessoa de
radicais que são necessários para neutralizar o paracetamol."
O efeito no fígado
Segundo o médico, o efeito do paracetamol no fígado é tardio. "Depois de 12
horas a pessoa começa a sentir náuseas. Depois de 24 horas começa a ter
dor de cabeça muito forte por causa da lesão do fígado. E aí não adianta dar
nada, porque o antídoto só funciona, na melhor das hipóteses, antes de 24
horas. Depois disso é muito tarde."
Ele contou que há 3 anos saiu na Pediatrics um estudo alertando para esse
efeito, dizendo que uma criança que tomou paracetamol e está vomitando
poderia estar com overdose de paracetamol. "E tanto é verdade que muitos
centros já aplicam um antídoto quando uma criança que tomou paracetamol
é atendida e a mãe não sabe dizer qual foi a dose. Depois fazem a
dosagem. Se for baixa, suspendem o antídoto."
O paracetamol e a febre
Anthony Wong lembrou que vários antigripais contêm paracetamol. Lillian
pediu para o médico citar alguns nomes-fantasia para que as pessoas
pudessem saber de que remédio estão falando. Citou como alguns exemplos
Tylenol, Naldecon, Cheracap, Cedrin e Dimetap. "Quase todos os antigripais
têm paracetamol e muito facilmente causam overdose."
O especialista explicou que não se deve nunca começar um tratamento de
gripe com aspirina. "Motivo: existe uma doença chamada Síndrome de Reye,
que causa a destruição fulminante do fígado se a pessoa tomar aspirina e
tiver propensão genética de destruição maciça no fígado." Ele contou que
essa advertência sobre o uso da aspirina foi feita no fim da década de 70,
começo da década de 80.
"Quando saiu essa advertência, a incidência de Reye nos Estados Unidos
era mais ou menos de mil casos por ano. Praticamente 95% das pessoas
morriam. No Brasil não era muito menor. Depois da advertência, o número de
casos caiu para 25 ao ano. Isso demonstra que existe uma associação
causal com uso da aspirina."
Alternativas
O médico deu algumas alternativas ao paracetamol. "Tenho uma certa
preferência pela dipirona (novalgina), mas o ibuprofeno (advil para adulto e
alivium para criança), que está entrando agora no mercado, é bastante
seguro." Wong lembrou que nem a aspirina nem o paracetamol podem ser
ingeridos em casos de dengue. O primeiro porque causa sangramento e o
segundo porque ataca o fígado.
Sobre reação anafilática, Wong explicou que independe do medicamento.
"Pode acontecer com qualquer remédio, desde dipirona, pinicilina (o mais
comum de causar alergia), ácido acetilsalicílico, até picada de abelha. A
dica é: evite ao máximo tomar remédio. Se precisar, tome com cautela, com
cuidado, mesmo que seja a 1/10 de vez que estiver tomando aquele
remédio."
O paracetamol e a estatina
A jornalista Lillian Witte Fibe perguntou a ele se é perigoso misturar o
paracetamol com a estatina, que é usada para o controle do colesterol.
"Ainda não foi demonstrada uma associação entre os dois. Parece que
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atuam em lugares diferentes dentro da célula hepática. Sabemos que alguns
antibióticos, como a rifampicina, usada para tuberculose, e também alguns
antibióticos da linha do cipro podem se associar ao paracetamol e provocar
uma lesão de fígado."
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